12 novembro 2006

Porque Hoje é Sabado

Ia deixar pra falar sobre isso mais pra frente, até porque tenho postado muitos temas autobiográficos neste pós-eleição.

Acontece que quero divulgar um show que vai rolar no Villaggio amanhã, cujos artistas são protagonistas de um fundamental capítulo na minha existência.

Então, lá vai:

Paulinho Santiago (ex-Paulinho Rock'n Roll) e Hamilton Moreno são cantores, compositores e violonistas. Já quarentões, ainda vivem de música, aqui e ali. Paulinho mora em Floripa e toca na noite por lá. Hamilton há bem pouco tempo ainda era vocalista da Havana Brasil, dissidentes dos famosos Heartbreakers, salseiros que, anos atrás, animavam as quartas do Avenida Clube e que, por sua vez, são originários da banda Sossega Leão, da década de 1980.

No entanto, entre os anos de 1982 e 1995, o palco preferido da dupla ficava no bairro do Bixiga, na Rua Santo Antonio, quase esquina com Treze de Maio.

Mais precisamente, no bar "Porque Hoje é Sábado"

Ali, eram sucesso garantido, dividindo as atenções com outro ídolo do local, o cabeludo Cacá, que morreu no ano passado.

Parceiros em dezenas de canções, Paulinho e Hamilton emplacaram algumas delas no "Porque..." como verdadeiros hinos: Santo Antonio com Treze de Maio, Dama da Noite, Loucos são Vocês e Domínio (que faz parte do CD Villaggio Café 10 anos) eram cantadas de cor pelos freqüentadores habituais do bar.

Dentre eles, eu.

O Bixiga de vinte anos atrás equivaleria à Vila Madalena de hoje, em termos de charme e badalação. Porém numa área muito menor e - detalhe importante - sem mauricinhos.

Basicamente era a Rua Treze de Maio, cheia de bares e com tanta gente circulando - artistas, jornalistas, cineastas, escritores, estudantes e baladeiros em geral, ao lado de junkies, metaleiros e bichos-grilos - que impediam os carros de andar. Parecia avenida da praia em pleno verão, um clima tão espetacularmente boêmio que muitos chamavam o bairro de "Quartier Latin Brasileiro". Na Treze fizeram história o Café Soçaite, o Piu Piu (tá lá ainda), o Café do Bixiga (idem), o Personna, o Cineclube Bixiga, a Livraria do Bixiga e, alguns anos mais tarde, o Dom Quixote, o Café Pequeno, o Café Aurora e o Cosa Nostra.
A concorrente, quase paralela, Rua Santo Antonio abrigava o Boca da Noite, o Chopp Hauss, o Café Brasil e, no número 1.015, o "Porque..".

Fui parar ali por acaso. Em 1982, a passeio na Capital, conheci o fervilhante bairro e me fascinei por alguns de seus bares, em especial o Café Brasil. Nele tocavam Hamilton e Paulinho e, a cada vinda a SP, lá estava eu. Em 1985, ao me mudar definitivamente pra cá, virei habituée.

No entanto, entre idas e vindas, numa fria noite de 1986 após um jogo da Copa do Mundo, dei com a cara na porta, não sabia que iria estar fechado. Lobo solitário, com poucas opções naquele momento, atravessei a rua e, arriscando, entrei num barzinho rústico, escuro e de decoração bem simples. Recebido com simpatia pelo dono, acomodei-me numa mesa de canto e ali fiquei até fechar, bebendo e ouvindo os músicos da casa.

Não poderia imaginar que, a partir dessa noite, minha vida mudaria pra sempre.

No final de semana seguinte, voltei. E voltei dezenas de outras vezes, até perceber que não tinha vontade de ir a mais bar nenhum. Toda sexta e sábado, sem falhar, lá estava eu, da hora de abrir até fechar" - sempre por volta das quatro, às vezes cinco da manhã.

Batendo ponto, me enturmei e todas as minhas namoradas e amigos surgiam naquele pedaço, além de levar pra lá o meu povo (alô Ricardo, Roselly, pessoal da Sete de Abril...). No Porque conheci a Rozana, final de 1988, e a Natália, saudosa comadre; a Dulce, a Márcia Peixoto, o Ciro, o Amin, o Ageu, o Guiné e tantos mais.

O "Porque..." era um vício para muitos. Sempre lotado, tinha um astral contagiante e músicos de primeira.
Fiquei tão ligado a ele que acabei virando sócio - de 1990 até 1996 (alô família De Lucca: Paulo, Sônia e Lurdinha...!).

Curiosamente, no entanto, nesse período o mundo começou a mudar radicalmente. Os tempos românticos e boêmios foram invadidos por coisas estranhas chamadas computador, celular, internet, axé-music, games, esportes radicais,  jabás. O público foi diminuindo, mudando de interesses. Com isso, a situação complicou financeiramente e a mágica cessou de vez. Com o movimento já muito fraco, num esforço final a Rô comprou a parte dos meus sócios e a gente mudou o nome para "Quase Acústico". Em 1996, apareceram uns malucos interessados e - já sobrecarregados pelo Villaggio - optamos por vendê-lo.

Nunca mais o Bixiga foi o mesmo. Nem o mundo, nem a música. Nem nós.

Tudo mudou e Paulinho da Viola já disse: "meu tempo é hoje". Certo, mestre; ainda assim, isso não impede de vivermos alguns flash-backs de vez em quando: depois de oito anos sem tocar juntos, Paulinho e Hamilton vão se reencontrar, desta vez no palco do Villaggio (onde mais poderia ser?).

As três comunidades do bar no Orkut já estão avisadas. Vários amigos da época devem aparecer. Será?...Bom, mesmo que não venha ninguém, eu e a Rô estaremos na primeira fila.

Se quiserem entender um pouco do que digo, estão convidados. Amanhã, 14 de novembro, 21 horas.

Ah, sim: o nome do bar homenageava o poema do Vinícius, claro. Parte dele foi pintada na parede, acima do palco. Aqui vai ela:

Dia da Criação
Vinicius de Moraes

Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.

Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas

Porque hoje é sábado.

12 comentários:

Anônimo disse...

Oooopss... pra completar este post, faltou um parágrafo sobre "aquele" concurso que vc ganhou cantando Tigresa e a foto :-)

Anônimo disse...

E.T. eu sei que não foi no PQ... só não lembro o nome do bar :-(

Zé Luiz Soares disse...

Foi no Café Brasil, Rose. Julho de 1986. Por coincidência, o Paulinho, que toca amanhã, me acompanhou ao violão...

Grande noite, não? Mas acho que só ganhei porque levei a maior torcida, hehehe.

bjs

Nil Tojal disse...

Zé,você nessa época chegou a conhecer um cara que tocava sempre no Porque e em outros bares do bexiga. Caca, cabeludão, negão alto?

Na verdade queria saber se tem alguma foto, ou vídeo, alguma lembrança que fosse dele, sou praticamente um afilhado dele, e como hoje ele não está mais entre nós queria ter essa recordação.

Se tiver facebook me adicione

http://fb.com/NilTojaldeAlmeida

meu e-mail niltojal@niltojal.com.br

Trecos-Larecos disse...

Olá, também somos dessa época. Antes de frequentar o Porque o lugar predileto era o Café Brasil com os Sobrinhos do Capitão.
Tristes em saber que o Cacá morreu e agora também o Ruffino, mas a vida segue!
Casei com o Ricardinho que nesta época tocava nos sobrinhos e no Porque com o Paulinho e Hamilton,seu texto nos trouxe doces lembranças!

Alex Sander disse...

Era muito bom, o melhor bar que já teve em São Paulo, hoje estar esquisito, faz muita falta o pôquer!

Makárius disse...

Olá como vai vc É o Makárius espero que bem, te encontrei por acaso por aqui . grande abraço.

Stella Sodré disse...

Olá tudo bem?
Frequentei muito o bar e tive ótimos e inesquecíveis momentos no porque hj é sábado e adoraria saber como está o Paulinho e por onde ele andas,.ahh inclusive eu tenho uma fita gravada do Paulinho com essa música santo Antônio treze de maio 😀
Ficarei muito feliz em saber como está o Paulinho, obrigada 😘

Stella Sodré disse...

Ahhh meu email é
stellasodre@yahoo.com.br
Valeu

traquitana disse...

Olá! Muito obrigado por compartilhar essas informações! Estou entrando em contato pois sou sócio de um estúdio de gravação onde ficava o "Porque hoje é sábado", e estamos resgatando a memória do espaço. Queria saber se você tem fotos ou registros do espaço para compartilhar com a gente. Essa memória é um legado da história da cidade e queremos fazer esse resgate.
Muito obrigado desde já e um grande abraço.

Elcio disse...

Olá!! Eu sou Elcio, frequentador do "Porque". Conheci lá por acaso, eu fui a uma casa italiana - Amigo Gianote - comer fogazza, a melhor mesmo, ao sair andando com um amigo, Paulinho Francisco, passamos em frente e ouvimos o Cacá cantando, decidimos entrar ... viramos clientes, levamos amigos e colegas, bebemos Vodka com mel e limão, Cacá sentava conosco para beber com a gente, o dono do bar sentava com a gente ... a Sônia me encantei com ela, sempre simpática e charmosa.
Pena que fechou ou que o mundo mudou.
Talvez porque o dia mudou e não era mais sábado, virou segunda ou qualquer outro dia.
Valeu a lembrança.

ELCIO disse...

Olá Zé! Você teria fotos do "Porque" com o Cacá e o povo que frequentava o barzinho?
Se tiver, você poderia postar neste blog pra gente matar a saudade?

Seguidor Elcio Evaristo