08 novembro 2006

You Tube, Festivais e Tetê

O site www.youtube.com é teste pra cardíaco - como diria o Galvão Bueno. Cada vez que entro, compro uma passagem pro Túnel do Tempo e, invariavelmente, se arrepiam os pêlos do meu braço direito (sei lá por quê, mas os do esquerdo, não). Às vezes correm até algumas lágrimas, solidárias.

Sejam George Harrison e Ringo Starr pós-Beatles, Os Trapalhões, Tom Jobim dando entrevista ou Secos & Molhados no Maracanãzinho, é duro agüentar sem balançar. Façam o teste: é só entrar e digitar o que quiserem. Se algum maluco tinha a imagem e a colocou no site, você vai voltar ao passado - prepare-se.

Ontem, foi a vez do Festival dos Festivais, da Globo, o último que marcou na história da MPB. Outubro de 1985, havia acabado de me mudar pra São Paulo e morava numa quitinete em Santa Cecília, de favor (alô, Geribello). Tinha comprado uma TV de 14 polegadas no Mappin, a prestação (chamávamos o carnê de "atestado de pobreza"). Duro, sem grana pra sair, ficava muitas noites na frente da telinha, e bem nessa época rolava o tal festival.

Lembro-me razoavelmente das imagens - afinal, lá se foram 21 anos, e de lá pra cá nunca mais as tinha visto. Vagas lembranças de Mira Ira, com meus hoje amigos Miriam Mirah e Lula Barbosa; da Leila Pinheiro (linda...), estreando na carreira com Verde - dos meus hoje amigos Eduardo Gudin e Costa Netto; lembro do Joelho de Porco, do Emílio Santiago cantando Elis, Elis e - claro - da Tetê Espíndola ganhando com Escrito nas Estrelas.

Muita água rolou debaixo da ponte, desde então. Essas imagens foram sumindo da minha memória, e só voltei a falar do Festival quando o Villaggio já recebia em seu palco os próprios - Lula e Miriam -, cantando a mesma Mira Ira (que ganhou o segundo lugar). Posteriormente, o Costa Netto (Verde ficou em terceiro) me revelou alguns bastidores da época.

Coincidentemente, ambos se consideraram injustiçados pela vitória da Tetê, pois, segundo contam, suas músicas eram consideradas as favoritas dentro de seu círculo de relacionamentos, pessoais e profissionais. Pois é.

Eu, que não tinha uma recordação clara dos respectivos desempenhos, tendia a concordar com ambos. Verde primava pelo aspecto do samba urbano, elegante - marca do Gudin, e pela letra politizada do Costa ("...verdejantes tempos, mudança nos ventos no meu coração"). Virou clássico da MPB e lançou Leila Pinheiro, o que não é pouco.

Mira Ira
, de belíssima melodia, pegava pela emoção e puxava pra brasilidade ("...canela, cachaça, bela raça: Brasil!"). Sem falar nas intepretações, absolutamente arrepiantes.

E a vencedora? Teria sido marmelada? Tenho uma vaga lembrança de comentários sobre a preferência do poderoso Boni por ela, o que teria determinado o resultado. Boato maldoso?

O You Tube esclareceu a dúvida pra mim. Eliminatória de São Paulo: quando o Duofel executou os primeiros acordes, Tetê percorreu o caminho pro palco toda fagueira, acesa, com um brilho espetacular no rosto, e começou a cantar com sua voz agudíssima, já estava na cara: não tinha pra ninguém. Só podia ser ela a vencedora, todos os fatores conjugavam pra isso. Sua intepretação era tão marcante que nada iria superá-la, mesmo a música sendo relativamente simples, com letra despretensiosa. Apenas uma "tola canção romântica", como se diz, mas que - com Tetê - ganhou ares de "super-hit" nacional, virou mania em bares e karaokês e a projetou como uma grande estrela, ainda que não tenha conseguido manter esse status por muito tempo. Apesar do talento e dos grandes recursos vocais, virou a "cantora de Escrito nas Estrelas" e não conseguiu mais se livrar desse estigma.

Que me desculpem os meus amigos cantores e compositores, mas foi mais do que justo. Aliás, injusto foi Tetê não ter ganho o prêmio de melhor intérprete, que foi para Emílio Santiago, ou de revelação, que foi para a Leila. Merecia ter levado tudo, mas aí prevaleceu a mania brasileira de se "fazer média".

Pra confirmar esta minha opinião de hoje, pesquisei na internet e achei esta crítica do Zuza Homem de Mello, da época: "Ser aclamada por um coro de 10 mil pessoas no Maracanãzinho não é apenas uma emoção muito forte; é uma consagração. Para uma artista que, como Tetê Espíndola, aspirava por isso há oito anos, esta aceitação do público não apenas fecunda um fruto chamado sucesso, mas era previsível, estava escrito. Na noite de encerramento do Festival dos Festivais da Rede Globo, não havia dúvidas de que Tetê seria a grande vencedora; público e júri já haviam dado indicações disso nas duas fases anteriores em que 'Escrito nas estrelas' foi apresentada - na eliminatória de São Paulo e na semifinal, no Rio. Em todos, a mesma impressão forte, nascida de um impacto diante daquela voz aguda, mas doce, e daquela presença segura e confiante, cheia de uma energia que, como Tetê diz, 'transmitia e recebia de volta'." (crítica da revista Visão / novembro de 1985)

Quem quiser conferir, é só clicar aqui, e boa viagem(são os vídeos da eliminatória de São Paulo, em 05/10/85):
Escrito nas Estrelas (Arnaldo Black - Carlos Rennó)
Mira Ira (Lula Barbosa - Vanderley de Castro)
Verde (Eduardo Gudin - Costa Netto)

5 comentários:

Anônimo disse...

Zé,
Realmente o Youtube é fantástico, tem coisas memoráveis, assisti o João Gilberto dando entrevista, o encontro dele com o Tom depois de 30 anos, um vídeo do Bando de Tangarás com o Noel Rosa, é realmente fascinante ... você deveria garimpar alguns vídeos de apresentações no Villaggio ... fica como sugestão !

Um abraço

Fábio

Zé Luiz Soares disse...

Pois é, Fábio, o único porém é o tempo que gasto cada vez que vou lá...atrapalha todo o resto, pois sem conseguir me controlar, fico horas vasculhando. É envolvente demais.

abraço.

Anônimo disse...

Caro Zé,

Finalmente vc atendeu minhas suplicas e voltou a falar de coisa agradável, que é musica e não política, argh! Pensei que vc fosse continuar a falar sobre a composição do mini-sterio e base (ou pé-no-saco!) de apoio. Pôrra, Zé vc como cabo eleitoral é um ótimo crítico de música...

Levi

Zé Luiz Soares disse...

Cabo eleitoral ruim?? Mas reelegemos o homem, não foi?...E de lavada... hehehe.

Como eu havia te dito, meu irmão, os posts políticos eram uma reação ao ataque da mídia.

Agora que a coisa acalmou, vamos deixar o homem trabalhar e falar de coisas mais amenas.

abs

Anônimo disse...

Zé, não venha com historia pro meu lado... Quem foi que me enviou capas e capas da veja espinafrando fhc?