04 março 2008

Linha de Passe marca um golaço

Uma das maiores audiências da ESPN Brasil, a mesa-redonda futebolística Linha de Passe, sempre às segundas, é o melhor programa do gênero - disparado.

Jornalistas top de linha como Juca Kfouri, Fernando Calazans, Márcio Guedes, João Palomino e Paulo Vinícius Coelho (o PVC), regidos pela batuta do mestre José Trajano, comentam os fatos da semana com extrema competência, coerência, precisão nas informações, isenção, elegância - e um bom-humor - únicos. Longe dos merchandisings, dos interesses pessoais, das histerias e gritarias comuns aos concorrentes dominicais, dão um show de bom jornalismo esportivo.

Ontem (aliás, hoje) fiquei até duas e meia da manhã vendo a reprise, sem conseguir desligar.

Muito desse sucesso deve-se à personalidade e liderança do Trajano, sem dúvida uma lenda da imprensa esportiva nacional, com sua impressionante clareza e "timing" nas intervenções, misturando muito bem indignação, falta de paciência para bobagens, ironia fina - por vezes beirando ao sarcasmo - e uma notável cultura geral, aliados à boa malandragem carioca.

Voltando ao programa de ontem, chamou-me a atenção um pequeno "desvio" do tema futebol. Questionando a repercussão que certas comemorações bem-humoradas de gol vêm causando nos últimos tempos, Trajano iniciou um caloroso e oportuno debate.

Dizia ele que não compreendia porque a mídia e o público em geral se indignaram tanto com um jogador do Flamengo, que comemorou seu gol imitando alguém chorando - nítida provocação ao rival Botafogo, que, através de dirigentes, técnico e jogadores, semana passada reclamou demais (exageradamente, até) de ter perdido determinado jogo, protagonizando o episódio que ganhou nacionalmente o merecido apelido de "chororô".

Nessa linha, questionou por que a mesma indignação não é vista em comemorações onde se imita alguém dando tiros ou dançando pornograficamente. Mais: por que também não há indignação parecida nos casos de entradas violentas ou atitudes visivelmente anti-desportivas.

Sua bronca era que a tal comemoração imitando choro não passava de algo na linha do chamado "bom-humor", beirando ao ingênuo, muito longe de qualquer mau-caratismo. Indo adiante, se disse extremamente preocupado com a falta generalizada do mesmo bom-humor no Brasil, e com a crescente onda de mediocridade que assola o país.

E daí a coisa partiu para questionamentos maiores, chegando à constatação de que a mediocridade é geral, em todos os campos da cultura nacional.

Pronto: foi o bastante para todos ali se manifestarem, como se o assunto estivesse entalado nas suas gargantas. Com maior ou menor intensidade, cada um extravasou sua angústia diante do rumo que segue a nave da cultura, e o comportamento geral da sociedade brasileira.

Tudo aquilo que volta-e-meia falo aqui foi citado: o atual culto às celebridades, do tipo BBBs que viram astros; a falta quase que total de boa leitura; o ensino nivelado por baixo; a busca frenética por sucesso, bens materiais e status; etc. etc.

E, claro, o que foi feito com a música popular de qualidade, hoje "terra arrasada" no nosso pobre Brasil, dominado por sertanejos, axés e pagodes românticos.

A coisa foi se ampliando, e nos e-mails de telespectadores que são normalmente lidos durante o programa, o tema futebol foi várias vezes deixado de lado, para dar lugar a manifestações de solidariedade aos jornalistas e - em alguns casos - de preocupação, ou mesmo temor, com o que vai sobrar para as gerações futuras.

Vale registrar que, antes que os mais apressadinhos concluíssem que - pra variar - é tudo culpa do governo Lula, o respeitadíssimo e incorruptível (ainda que corintiano...dá-lhe Valdívia!) Juca Kfouri foi perfeito ao intervir, lembrando que Tchans e quetais nasceram e tiveram seu apogeu no interminável governo do sociólogo FHC. É...isso tem que ficar sempre muito claro.

Impressionante. Por essa eu não esperava. Teríamos assunto e debate para horas de programação, o que obviamente não foi possível pelas limitações do programa.

Pergunto eu: POR QUE não se debate mais esse fundamental tema? Caramba, tenho certeza que milhões (eu disse milhões) de brasileiros sofrem das mesmas angústias. E não encontram eco para seus questionamentos. E nem espaço, diante de uma mídia tão capitalista quanto irresponsável.

Precisou um programa de esportes - sem trocadilho - levantar essa bola?

Meus amigos: as melhores cabeças do Brasil estão (novamente sem trocadilho) de bola murcha. Muita gente de valor nas artes em geral, no jornalismo, na educação, no esporte, tá há tempos deprimida com o que se vê por aí.

Humildemente, neste meu modesto espaço, proponho a criação de uma "Corrente Nacional contra a Pobreza Cultural".

Vamos nos falar, gente. Antes que seja tarde demais.

Um comentário:

Ana Paula Xavier disse...

eu topo!
:)