01 fevereiro 2007

Um ubatubano

Eu já não estava entendendo mais nada. Sete e meia da manhã de ontem, ao lado do meu irmão na Rio-Santos, vendo o sol despontar, rumo a uma funerária em Ubatuba.

Tudo muito esquisito. Um amanhecer daqueles de verão, espetacular, e a gente meio zonzo, sono misturado com angústia, cuidando pra não correr demais e tomar uma multa. Nossas mentes escurecidas e aquele sol insistindo em iluminar a mata atlântica, tudo emoldurado pelas janelas do carro.

Mal havia tido tempo de tentar retomar a rotina depois da morte da Maria; apenas quatro dias se passaram e lá estava eu consolando meu pai com a perda do seu último - e, por isso mesmo, mais querido - irmão.

Em 2003 três safenas o salvaram, mas desta vez não houve o que tentar, nem daria tempo.

Tio Clementino era aquele que podia se chamar de "bom camarada". O maior ubatubano que já conheci, sabia de cor os caminhos da sua cidade, pelas ruas, matas e mares. Amigo de todo mundo, tirava do bolso (e da boca) pra dar para os mais necessitados. O tempo todo.

Pessoas assim não existem mais. Cada vez que ia nos visitar em São Sebastião levava suas prendas. Um cacho de bananas imenso, algumas tainhas frescas, quilos de farinha de mandioca do Sertão do Ubatumirim (a melhor de Ubatuba), palmitos enormes; enfim, de mãos vazias é que ele não ia.

Sessenta e seis anos bem vividos. De muitas serestas, muito pirão de peixe, muito futebol de várzea, muita carne de gambá e de tatu (sai pra lá, Ibama, que isso é coisa de caiçara antigo).

Se rosto no caixão estava sereno, quase sorridente. Como ele sempre foi. Como sempre será nas nossas lembranças.

Nossas lágrimas escaparam, não eram pra acontecer. Melhor seria uma cantoria, um violão.

Até mais ver, tio. Sua passagem por aqui não foi em vão, tenha certeza.

3 comentários:

Anônimo disse...

Bonito, mano...
O tio era tudo isso e, como vc tbm havia definido, um "meninão". Doce, puro, amoroso e bondoso. Não quis "dar trabalho" nem quando teve que sair de cena. Foi em paz, e deixou-nos lindas lembranças. Ficou o nosso amor por ele. Tem uma música dos Beatles que diz: "E, no final, o amor que vc recebe é igual ao amor que vc dá".
O amor dele por nós já deixa saudades.

LUCIANA DE GRAMMONT disse...

ZÉ...
MAIS UMA VEZ ME EMOCIONEI COM VC E POR VC...
PERDER ALGUÉM PARA O "MISTÉRIO" DA MORTE É DURO..
EU, QUE JÁ PERDI TANTO(MÃE, PAI E IRMÃOS), SEI O QUE É A DÔR LATENTE E DIÁRIA.
MAS COMO SEMPRE, VC DESCREVEU TUDO COM DIGNIDADE E COMPAIXÃO.
SOU SUA FÃ ZÉ LUIZ HOJE E SEMPRE!
BEIJOKA NO CORAÇÃO,
LUCIANA DE GRAMMONT

Anônimo disse...

MUITO LINDA A SUA HOMENAGEM PRIMO,VC SOUBE DESCREVER MEU PAI MUITO BEM.ELE REALMENTE FOI ASSIM E MAIS UM POUCO.MEU PAI FOI UM HOMEM DE CORAÇÃO BOM EM TODOS OS ASPECTOS,COM ELE NÃO TINHA TEMPO RUIM,FOI UM PALMEIRENSE ARRETADO,"CHÃO PARADO" ELE DIZIA.TIVE TUDO QUE PODERIA TER:PROTEÇÃO;AMOR;CARINHO;ATENÇÃO; DEDICAÇÃO;EDUCAÇÃO;BONS CONSELHOS;APOIO;E AGORA ELE ME DEU A SAUDADE.APRENDI QUE NA VIDA AS PESSOAS SÓ MORREM QUANDO SÃO ESQUECIDAS,PORTANTO,MEU PAI VIVE.OBRIGADA PELA HOMENAGEM,REALMENTE VC SOUBE ESCOLHER PERFEITAMENTE SUAS PALAVRAS.UM GRANDE ABRAÇO Á TODOS E FIQUEM COM DEUS.ASS.:THAIS FERREIRA SOARES.