Desta vez para falar sobre o sambista Luiz Carlos da Vila, falecido nesta última segunda-feira, que era um grande amigo e artista único.
Como já ia escrever aqui a respeito, nada melhor do que aproveitar o mesmo texto e aproveitar para divulgar mais um pouco o Gafieiras.
O samba está de luto: morreu Luiz Carlos da Vila.
Boa leitura:
Luiz Carlos do Villaggio
por ZÉ LUIZ SOARES, produtor artístico e proprietário do Villaggio Café
Já fazia tempo que não o via. Tive a sorte de reencontrar Luiz Carlos da Vila numa noite de autógrafos do Moacyr Luz, no paulistano bar Pirajá, há alguns meses. Ali, conversei com os dois sobre a idéia de retomar o projeto de samba no Villaggio e se eles achavam viável voltar ao nosso palco, como antigamente. Resposta positiva de dois irmãos – mais do que grandes artistas.
Destino, não deu para o poeta: alguns dias depois foi internado e nesta segunda (20/10) nos deixou de vez. Mas gravou, para sempre, sua marca nas nossas vidas de donos de bar e produtores musicais.
Lembro-me bem daquela noite quente de janeiro de 1998, quando a fera estreou no Villaggio e estabeleceu o recorde de público até então. Ficamos atordoados com tamanhas energia e carisma, não estávamos preparados para tanto. Sua frase, ao final: “eu sempre soube que aqui ia dar o maior pé”. Dali por diante decidiu que aquela seria a sua casa em São Paulo, iniciando uma série de shows antológicos - datas aguardadas e cobradas pelo público, que simplesmente delirava com suas apresentações, sempre apoteóticas. Quando ficou doente gravemente pela primeira vez e conseguiu se recuperar, fez questão de que o retorno a São Paulo fosse num show no Villaggio.
Mais uma noite inesquecível, quando mostrou, em primeira mão, “Papéis” - parceria inédita na época com Wilson das Neves, depois gravada por Zeca Pagodinho - que imediatamente foi acrescentada ao rol de clássicos que são cantados nas rodas até hoje.
Luiz fazia um samba diferente, lapidando letras que colavam na hora na boca do povo, mesmo sendo de uma sofisticação que mais poderia agradar aos intelectuais de plantão. Tinha queda especial pela poesia, mas não descuidava na hora de escolher as melodias onde encaixá-las. Um craque, um Cartola dos tempos atuais, dotado de magnetismo que instalava clima de festa onde quer que estivesse. Roda de samba com Luiz Carlos da Vila era certeza de epifania.
Na intimidade, um cara simples e carinhoso com todos. Culto, articulado e politizado, não foi à toa que imortalizou na letra de "Kizomba - A festa da raça" a inesquecível frase “o pagode é o partido popular”. Gênio! Lembro-me que, certa ocasião, ao buscá-lo no hotel para mais uma apresentação, lamentou ter de desligar a TV: “Zé, adoro assistir ao Discovery Channel”. Sensacional.
Sinceramente, penso que, quando a ficha cair, vamos perceber que sua ausência será mais dolorosa do que parece agora. O samba contemporâneo perdeu, talvez, seu mais importante personagem. Uma referência para os novos, um alento contra a mesmice, um construtor de imagens impactantes. Luiz Carlos da Vila se foi cedo demais - e o samba ficou órfão.
Um dia, veio com esta, com aquela expressão sacana que a gente já conhecia - sabendo que ia deixar muito nego com inveja: “Zé, eu gosto tanto de cantar aqui que já estão me chamando de Luiz Carlos do Villaggio”...
Que assim seja.
Texto publicado em 23 de outubro de 2008.
2 comentários:
Caro Zé Luiz,
Cheguei até o seu blog pelo do Moa (camarada pelo qual guardo muita admiração e carinho).
O Luiz realmente desafinou cedo demais. Deixando a gente com aquele pensamento ingrato e singelo de "puta que pariu!", ou melhor, "puta que partiu!".
Realmente um gênio: no jeito e na arte.
Felizmente tive a sorte de encontrá-lo (uma vez que seja) em um desses palcos da vida.
Grande abraço e muita sorte sempre.
Dudu Nicácio
www.myspace.com/doisdosamba
Muito legal, Zé, falou tudo. beijos
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