03 outubro 2006

Adeus, Lua Music

Com todo esse fuzuê de eleições, quase me esqueço de escrever sobre minha saída da Lua Music.

Pois é, desde o início de setembro deixei de ser o diretor artístico dessa gravadora, que montei em março de 2000, a pedido do dono - o compositor Thomas Roth (atualmente jurado do Programa Ídolos do SBT).

De lá pra cá foram exatamente 105 Cds lançados, e 02 DVDs. Uma longa e bela história, de muito trabalho, dedicação, sucessos e fracassos.

De todos esses lançamentos, acredito que pouco mais da metade tenha sido iniciativa exclusivamente minha, certamente aqueles mais ligados à raiz da MPB, a chamada "de qualidade", ou "clássica". Rótulos, claro. Os demais foram tentativas de atingir nichos de mercado, ou mesmo apoio a artistas amigos, ou projetos de outras pessoas de dentro da gravadora.

O fato é que, graças ao apoio (e ao dinheiro) do Thomas, pude colocar no mercado pelo menos trinta discos antológicos, daqueles que serão citados daqui a cinqüenta anos, como os dois do saudoso Guilherme de Brito, o do Casquinha da Portela, os dois do Jards Macalé, os dois do Moacyr Luz, o do Nelson Angelo, os dois do Filó Machado, o CD e o DVD do Samba do Trabalhador, o do Dom Salvador, o ao vivo do Baden Powell, o da Alaíde Costa que acaba de ser indicado ao Grammy Latino - assim como foi o da Velha Guarda do Salgueiro em 2004 -, o do Cláudio Nucci cantando Dorival Caymmi, os instrumentais do Futricando, da dupla Edsel Gomez/Arismar do Espírito Santo (América), das canções do Chaplin, e dos novos valores Moisés Santana, Rebeca Matta, Fernando Forni, Zé Guilherme, Virgínia Rosa e Juliana Amaral. Dessa lista de preciosidades, fechei com o espetacular "Vida Noturna", do compositor Aldir Blanc, pra mim o mais especial de todos, pela síntese que faz da minha (curta) carreira de produtor musical, ao reunir - de uma só vez - Aldir, João Bosco, Moacyr Luz, Guinga, Hélio Delmiro e Cristóvão Bastos, ou seja, uma verdadeira constelação de músicos e compositores (no link ao lado, caso haja curiosidade, tem as informações sobre todos esses discos).

Nos últimos tempos, por conta da forte recessão do mercado fonográfico, a Lua foi obrigada a adotar um perfil mais comercial, mais pragmático, passando a lançar discos de música eletrônica, new-age, católica, e a distribuir sertanejos. Com todo o respeito a esses gêneros, aos poucos fui sentindo um certo distanciamento desse novo projeto, o que, somado a outros fatores os quais não cabe aqui comentar, resultou na minha saída.

Mas saio com a sensação do dever cumprido. Mesmo sem ter vendido milhões de cópias (como, de resto, ninguém do nosso porte vendeu), agitamos o mercado alternativo da música brasileira. Nossos discos ocuparam diversas primeiras páginas culturais de grandes jornais pelo país, resgatamos nomes imortais, lançamos novos talentos, trouxemos prestígio à marca "Lua", enfim, fizemos um trabalho que vai ser lembrado por muito tempo.

O que vou fazer daqui em diante? Não sei direito...Por ora vamos tocando o Villaggio, regando a jaboticabeira e ficando de olho nas oportunidades - que surgem a toda hora.

Um comentário:

Anônimo disse...

Não sei que sentimento é mais avassalador; você deixando a Lua, ou a Lua deixando de lado projetos audaciosos, por "motivos de força maior"...
Acho Zé Luiz, que vc foi um "avatar" do bem, daqueles que acreditam tanto que se afogam no próprio pranto.
Pranto por saber que o nosso Brasil é difícil mesmo, o nosso povo é modesto mesmo(não aceita muito bem o que desconhece).
Pranto, porque sei da sua luta diária para fazer com que a nossa música, os nossos músicos, a nossa cultura simplista e tão sofrida pudesse ter um oásis no meio do deserto.
Bem, fica sim a certeza de um dever cumprido.Talvez, até demais Zé.
Afinal de contas respirar em baixo d'agua é impossível e acredito piamente que vc não se afogou.
Um beijo no seu coração e espero que pelo menos o nosso "Villaggio" resista"
Luciana de Grammont